Anos de euforia das montadoras nos EUA agora parecem uma bolha
Neal E. Boudette e Norihiko Shirouzo
The Wall Street Journal, de Detroit
Está década assistiu ao estouro das bolhas de tecnologia, imobiliária e do crédito. Ao que parece, outro segmento sucumbiu agora à exuberância irracional: o setor automobilístico americano.
As montadoras americanas levaram suas vendas para novos picos nesta década. Elas convidaram os consumidores a comprar carros a preços iguais aos oferecidos a seus funcionários, concederam financiamento sem juros por um prazo acima de seis anos e venderam um número sem precedentes para as locadoras de automóveis — estratégias que alguns analistas afirmam ter elevado as vendas a níveis artificiais.
Na maior parte dos anos 90, as montadoras venderam pouco mais de 15 milhões de carros por ano no mercado americano. Isso mudou no fim dos anos 90: com os baixos preços da gasolina e muitos consumidores animados pela euforia nas bolsas, as vendas de automóveis cresceram. O auge foi em 2000, quando atingiram 17,4 milhões. Nos cinco anos seguintes, elas ficaram na casa dos 17 milhões. Executivos da General Motors Corp. e da Toyota disseram que os Estados Unidos estavam caminhando para uma era de ouro do automóvel.
Eles estavam errados. As vendas começaram a cair em 2006 e este ano devem voltar aos níveis dos anos 90, um pouco acima dos 15 milhões de unidades. Na semana passada, a empresa de pesquisa de mercado Global Insight Inc. baixou as previsões de vendas para 2008, que devem ficar abaixo dos 15 milhões. A Global Insight acredita que elas não devem subir antes de 2012.
"Daqui para a frente, 16 milhões é um bom ano", diz Ron Harbour, cuja firma Harbour Consulting analisa a produção do setor.
Os erros de cálculo da indústria terão conseqüências maiores para a economia americana. O setor representa 4% do produto interno bruto, emprega 2,5 milhões de pessoas, direta e indiretamente, e gasta dezenas de bilhões de dólares por ano em pesquisa e desenvolvimento.
Por ter de projetar seus modelos e exigências de produção com cerca de três anos de antecedência, uma companhia que subestima sua demanda futura pode incorrer em grandes perdas. A brusca queda nas vendas já está complicando os esforços de reestruturação das três grandes de Detroit — GM, Ford Motor Co. e Chrysler LLC — e tem prejudicado as vendas das estrangeiras, como a Toyota Motor Corp.
O porta-voz da GM Tony Cervone afirma que a empresa não superestimou a demanda e culpou a crise de crédito pelas baixas vendas. Um porta-voz da Chrysler diz que a empresa prevê crescimento de longo prazo nos EUA, por conta do crescimento dos salários e da população.
As sementes para a euforia foram plantadas em 1999, quando o mercado acionário estava à toda e os americanos iam para as concessionárias se endividar, comprando carros novos.
Um ano depois, em 2000, a bolha da internet estourou e a economia esfriou. Depois do 11 de setembro de 2001, a GM começou a oferecer financiamento a juro zero por 60 meses. As vendas voltaram a crescer. No fim de 2002, muitos rivais da GM reclamavam que os descontos estavam prejudicando o lucro de todos. O presidente da GM, Rick Wagoner, rebateu numa conferência do setor em 2003: "Parem de chiar e joguem o jogo."
As montadoras de Detroit e algumas outras também tinham redescoberto outro meio de alavancar as vendas — as locadoras de veículos. Cada uma das montadoras de Detroit tinha uma fatia de alguma locadora de carros, de forma que empurravam seus carros não vendidos às locadoras a preços mais baixos. Em 2005, por exemplo, um quarto dos veículos da GM e da Ford nos EUA foi para as locadoras.
Num aspecto, as vendas entre 1999 e 2005 não parecem infladas. Os volumes permaneceram constantes, ao invés de terem surtos de alta. Porém, uma análise mais atenta revela uma incoerência: a economia estava em declínio em 2001-02. "Tivemos uma baixa econômica e as vendas de automóveis continuaram perto de recordes", diz Emily Kolinsky Morris, economista da Ford.
Os incentivos oferecidos pelas montadoras incitaram pessoas que ainda não estavam prontas para adquirir um carro a antecipar a compra, para aproveitar o desconto. Mas isso só transformou futuros consumidores em atuais compradores. Quando todos esses fregueses já não estavam mais no mercado, as vendas secaram.
No hay comentarios.:
Publicar un comentario